As raias mantas parecem ter escolhido Fernando de Noronha como seu novo lar. Antes esporádicos, os encontros de mergulhadores com raias gigantes na ilha tornaram-se mais frequentes nos últimos anos.
Isso não quer dizer que as mantas não ocorressem nas proximidades da ilha de Fernando de Noronha anteriormente. Apenas significa que, por alguma razão, uma pequena alteração em seus locais de frequência ou de passagem pode ter causado a coincidência entre as localidades utilizadas pelas mantas e aquelas frequentadas por mergulhadores, possibilitando um crescente número de encontros entre os dois grupos.
Visando pesquisar novos fatos relacionados à população local desses gigantes marinhos, o Projeto Mantas do Brasil realiza uma nova expedição para Fernando de Noronha, de 17 a 25 de março.
Embarcarão os pesquisadores Leo Francini, Paula Romano e Erika Beux. Os pesquisadores Nayara Bucair e Jayson Huss já estarão na ilha, à espera da chegada da equipe paulista. O grupo contará com o apoio do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) e pretende firmar outras parcerias locais para aprofundar as investigações.
Mais do que desejados pelos mergulhadores, os encontros com as raias gigantes propiciam momentos inesquecíveis e são buscados por mergulhadores no mundo inteiro, o que cria mais um atrativo ao arquipélago de Fernando de Noronha.
As observações da equipe do Projeto Mantas do Brasil – que conta com patrocínio da Petrobras e da Companhia Docas do Estado de São Paulo, Codesp, administradora do Porto de Santos – acerca de raias gigantes do litoral pernambucano tiveram início no ano de 2010, quando o jornal Diário de Pernambuco exibiu matéria noticiando um pescador que mostrava a cabeça de uma raia manta pescada nos arredores da cidade do Recife. Imediatamente perceberam que suas características eram diferentes das características dos animais observados no litoral paulista.
A cabeça da raia gigante pescada em Recife tinha cara e boca brancas (foto1). Ao contrário, os animais observados no Sudeste do Brasil, desde Santa Catarina até São Paulo, possuem cara preta, como uma máscara (foto 2).
Foto 1: a cabeça da raia manta pescada em Recife mostrava a cara branca. Imagem do jornal Diário de Pernambuco.
Foto 2: As raias mantas do Sul e Sudeste possuem padrão de coloração como a da foto acima, incluindo cara e boca negras, como uma máscara. A foto é do biólogo Leo Francini.
Apesar de raros, os registros da região Nordeste passaram a ser coletados e observados. Até que, nos anos de 2016 e 2017, os mesmos animais foram registrados tantas vezes em diferentes pontos de mergulho ao redor da Ilha de Fernando de Noronha, que é possível afirmar que estão residindo, ou, ao menos, passando longo período no local.
As raias mantas que têm sido observadas em Fernando de Noronha são jovens e de coloração quase que inteiramente branca em seu ventre, incluindo a cara e a boca brancas (foto 3).
Foto 3: As raias mantas de Fernando de Noronha apresentam padrão de coloração muito diverso daquelas do Sudeste brasileiro. Têm o ventre quase que inteiramente branco, incluindo cara e boca brancas. A foto é de David Luiz, colaborador do Projeto Mantas do Brasil e fotógrafo profissional da Ciliaris em Fernando de Noronha.
O fato de serem animais jovens não significa que alteraram seu padrão de coloração ao longo da vida. Uma das características das raias gigantes é o fato de nascerem, crescerem e morrerem não apenas com o mesmo padrão de coloração, mas também com as mesmas manchas e pintas ventrais. As manchas ventrais das raias mantas são singulares como as impressões digitais em seres humanos. É esse o fator que permite a fotoidentificação dos indivíduos e o acompanhamento de sua vida a cada novo encontro documentado por imagens.
As profundas diferenças observadas, não apenas no padrão de coloração das populações incidentes no Sudeste e no Nordeste, mas também em termos de habitat e comportamento desses animais, possibilitam a formulação de uma série de teorias, entre elas a de que se tratam de populações que não reproduzem entre si há tanto tempo que podem até mesmo ter resultado em populações geneticamente diferentes. As características muito diversas dos habitats e dos alimentos disponíveis em cada localidade, consideradas as baixas temperaturas da água no Sul e Sudeste e as águas quentes no litoral Pernambucano, podem também ter influência em sua coloração e padrões de comportamento.
Os pesquisadores pretendem dar início à divulgação dos novos dados coletados sobre os gigantes marinhos identificadas em Fernando de Noronha ainda no ano de 2018.
Curso de Fotoidentificação
Desde 2010, o Projeto Mantas do Brasil tem desenvolvido ações de educação ambiental e de pesquisa marinha sob o Programa Cidadão Cientista, utilizando o interesse dos mergulhadores pelos encontros com as raias gigantes em prol dos registros científicos.
“É possível ajudar nas pesquisas marinhas sem correr riscos e sem comprometer a diversão do mergulho”, comenta o instrutor de mergulho e da especialidade Mantaray Awareness, Ricardo Coelho, coordenador de tecnologia do Projeto Mantas do Brasil.
As informações concisas sobre como efetuar registros do ventre das raias gigantes, que sejam aproveitáveis pela pesquisa científica, estão disponíveis através de uma videoaula que pode ser assistida ao cadastrar-se no site do Projeto, acessível pelo link http://www.mantasdobrasil.org.br/index.php/cidadao-cientista/como-participar. Depois de assistir à videoaula que possui 12 minutos de duração, o candidato a Cidadão Cientista efetua um teste, também online, e recebe o Certificado após obter 70% de aproveitamento.
O conteúdo mais completo é um curso ministrado presencialmente, inteiramente gratuito e pode ser organizado pela escola ou dive center de preferência do mergulhador. Basta que a escola interessada organize uma turma em dia e horário previamente combinados para receber o curso, inclusive em Fernando de Noronha.